20 de junho de 2005

Texto - Argan

“Pode-se ter uma solução urbanística satisfatória e mesmo boa com uma má arquitetura. O que não é possível é o contrário. Não é possível ter uma boa arquitetura em um mau contexto urbanístico.

Giulio Carlos Argan

Imagino que essa frase seja verdadeira.

Pois o que entendo dessa afirmação quando Argan diz ser possível a existência de uma solução urbanística satisfatória sem que os objetos arquitetônicos individualmente tenham qualidade, é que no caso de um plano diretor, de uma organização, de uma urbanização planejada, prevista de acordo com dados da realidade local, esta não deixa de funcionar no caso da construção de má arquitetura em sua malha. Uma cidade que vive e evolui não deixa de funcionar pela simples construção de edificações ruins, sejam elas ruins tecnicamente ou apenas esteticamente.

Porém se o projeto urbanístico é falho, se o desenho urbano é intrincado, não planejado de acordo com o local, ou de acordo com qualquer teoria que garanta níveis mínimos de eficiência, então não importa quão bem feita são suas unidades individuais, uma vez que essas não se encerram em si mesmas estão conectadas umas as outras gerando um todo que funcionaria muito bem, porem funcionaria, -ia e não -ona. Não funciona pois a malha ligante não comporta o volume solicitado, ou não está logicamente espacializado, ou qualquer outra conseqüência proveniente de um planejamento ser qualidade.

Mas Argan na continuação de sua sentença já abre mão dessa possibilidade de independência entre o projetar da cidade e d edifício nos dias de hoje; diz ser impossível e inviável cogitar a manufatura de uma cidade ou de um edifício desconsiderando o respectivo.

Num mundo onde a maioria das cidades está plenamente construída, planejada ou não, não há espaço para Brasílias. Não podemos nos dar ao luxo de começar do zero, gerar uma nova forma de pensar, na qual nosso pensamento não precise ser mudado, ponto algum, onde nossa arquitetura caiba, caia como uma luva. A cidade já está feita, os vizinhos já têm fachada, alguns apenas elevação.

De qualquer forma, mesmo vivendo no mundo da individualidade, da alienação onde é cada um por si e poucos por alguém não podemos deixar transcender; a arquitetura, a cidade tem efeito drástico no ser humano, e apesar de ser feita por esses não pode se deixar poluir por tendências do mundo atual.

O arquiteto difere do homem comum na construção da cidade pelo estudo, pelo acúmulo de conhecimento, essa característica nos responsabiliza pelo tipo de arquitetura que estimulamos em nossos meios. Daí a impossibilidade de uma arquitetura isenta de conexões com a cidade, daí a consideração com o entorno, o respeito das leis de zoneamento, do código de obras.
É importante frisar que a atenção à regras de conduta arquitetônicas não devem exercer limitações no projeto, são apenas condições que garantem uma maior probabilidade de acerto. São como obstáculos naturais que com esperteza e criatividade o arquiteto adapta em/ao seu projeto.

É fato que existem exceções a toda regra, Ruy Ohtake por exemplo foge a muitas delas, afirmando em uma de suas palestras a estudantes de arquitetura que nem sempre o entorno é relevante, nem sempre a funcionalidade é relevante, disse ser necessário saber quando e como utilizar os fatores de projeto dados. Seguindo essa ideologia é necessário mais talento que a média para a realização de boas obras, a questão está em quem têm esse discernimento do “quando” e “como”.

Como já afirmei antes, repetirei amarrando às palavras de Argan: O código de obras, as leis, a consideração com o entorno, o zoneamento, o plano diretor, o planejamento urbano ligado à concepção projetual e vice-versa são medidas racionais que garantem uma melhor inserção do seu projeto arquitetônico, uma menor probabilidade de erros, ou pelo menos erros menores. A criação de obras sem esses aparatos é possível, mas exige talento e capacidade intuitiva apurada para que seja criado um bom projeto, afinal um projeto embasado na realidade e em muitas referências tem maior chance de solucionar um programa com qualidade que um gerado sem laços com a realidade, apenas arraigado nas maravilhas do ilusório de um arquiteto.

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